Convento de Cristo 2023

Informações: incursoeshermeticas@gmail.com

A partir de hoje, os visitantes do Convento de Cristo, em Tomar, já poderão apreciar a fachada ocidental da nave manuelina, que inclui a famosa Janela Manuelina, ou do Capítulo, após obras de restauro na ordem de um milhão de euros. Venha connosco no dia 27 descobrir os segredos do Convento de Cristo. Visita guiada por Luis de Matos.

27 Agosto, 10:30h; Visita guiada: 35€ [Entrada no Convento de Cristo é gratuita ao Domingo; levar Cartão de Cidadão]; almoço livre; a visita termina pelas 18h

Inscrições: incursoeshermeticas@gmail.com

Visitas de Verão 2023

Com o início do Verão, tal como tenho feito em outros anos, vou organizar algumas visitas guiadas de teor histórico/filosófico com um forte pendor de Tradição Lusíada na senda de António Quadros, Lima de Freitas ou Agostinho da Silva. Trata-se de revisitar alguns dos lugares emblemáticos do nosso Património Luso como pretexto (sim, como texto prévio) para os experienciar com outros olhos, com a Alma “ligada”.

incursoeshermeticas@gmail.com

2 de Julho 2023; 15h – 18:30h
A Quinta da Regaleira é um dos espaços simbólicos mais concorridos e conhecidos de Sintra. Interpretações diversas acerca dos seus mistérios têm preenchido livros, jornais, revistas e programas de televisão. Fala-se de Maçonaria, de Templários, de Segredos Alquímicos. A verdade é que a intenção do autor (sim, autor, como se de uma obra de arte se tratasse), parece estar longe destes temas. Contudo o simbolismo está lá! Patente e visível!
Convido-vos a visitar a Quinta da Regaleira, porventura de novo, mas certamente com novos olhos. Sim, vamos alinhar todas as interpretações mais populares e discutir de que modo estão ou não presentes. Mas iremos mais além. Vamos tomar as principais referências de Carvalho Monteiro e Luigi Manini: A Divina Comédia de Dante; Os Lusíadas de Camões e os Jardins Iniciáticos como expressão cénica de um percurso interior. Com base neles vamos abrir novas vistas sobre a Regaleira. Vamos deixar-nos submergir pela natureza, guiar pelos sentidos e despertar do sono quotidiano para a luz do excepcional.

15 de Julho; 10:00 – 18:30
Alcobaça e Batalha, com almoço

Tragam os amigos e a família!

Vamos criar boas memórias e viver a alegria de ser Português. Que viva o Verão,

Luis de Matos

incursoeshermeticas@gmail.com

6 Perguntas sobre o “Calepino Maçónico”, último livro de Luis de Matos

Calipono? Calupeno? Calíope? Mas afinal o que é um Calepino???

Eu também não sabia! Tinha vários em casa, mas não sabia! A ideia original era escrever uma pequena compilação de termos usados pelos Maçons e que o público em geral não conhece. Na realidade há uma linguagem própria da Maçonaria, como há, por exemplo, uma linguagem usada por algumas profissões – os tipógrafos, os músicos, os mecânicos, os médicos, etc. – que os “profanos” não conhecem. Todo aquele que não sabe usar os termos próprios é até visto com alguma desconfiança. O mesmo acontece na Maçonaria, que herda muitos termos e expressões do ofício de pedreiro, mas que os completa e amplia, dando lugar a um rico “shibboleth” (é este o termo correcto). Ora, um Calepino é um caderno de apontamentos, em geral composto de entradas que revelam essa linguagem cifrada. É uma espécie de Glossário manuscrito para uso do próprio autor. Quando me dei conta disso, lembrei-me que a maneira como eu mesmo fui aprendendo as inúmeras expressões foi assentando os significados em pequenos cadernos manuscritos que levava às sessões da minha Loja. Era nesses mesmos cadernos onde tomava apontamentos, elaborava esquemas simbólicos e deixava algumas reflexões que, mais tarde, colocava nas minhas Pranchas. O Calepino foi sempre um companheiro inseparável na Loja!

No livro defines 119 expressões usadas pelos Maçons. Queres dar exemplos?

Quando comecei a escrever pensei que iria encontrar umas 40 ou 50. Assim de cabeça podia citar algumas mais emblemáticas. Mas quando comecei a sistematizar o livro, apercebi-me que eram mais. Ao definir umas, inevitavelmente caía em outras. A lista foi crescendo e acabei com 119! Ou seja, muito mais do dobro do que estava inicialmente a contar. E podia ter colocado mais. Procurei não fazer um Dicionário (já há vários de grande qualidade), mas escolher as expressões usadas na Maçonaria que, noutros contextos, podem levar à confusão ou não ser sequer entendidas. É o caso do Oriente, que é mais do que uma direcção no espaço, da Coluna Sul, que é mais do que uma pilastra, do “estar a chover”, que é mais do que uma afirmação meteorológica, ou do Mestre da Harmonia, que não é bem um activista do Budismo Zen… Na Maçonaria o meio-dia não acontece sempre às 12h e a meia-noite nem sempre é às 0.00h. Parece estranho, mas não é. E todo o Maçon deve estar ao nível e pronto para um telhamento, porque os trabalhos decorrem “a coberto”, não numa vila ou cidade, mas “a Oriente” desta, conduzidos pelo malhete sábio e justo do Venerável. Por sorte, a Grande Dieta na Maçonaria não é um regime alimentar severo para perder peso, nem os canhões se carregam com pólvora nos Ágapes para matar ninguém, embora façam fogo! É mesmo um shibboleth muito particular. O livro ajuda todos os que se interessam pela Maçonaria a compreender a sua linguagem. Ajuda Aprendizes e Companheiros a entrar no imaginário simbólico da Ordem. Ajuda os Mestres a usarem os termos com o rigor que se lhes é exigido. Pareceu-me um serviço útil à Ordem, não disponível em muitas publicações.

Aproveitas algumas das expressões para contar algumas das tuas experiências pessoais. Até anotas algum do anedotário maçónico. É um livro auto-biográfico?

Sim, é verdade, conto alguns episódios verdadeiros passados comigo e recupero alguns que me contaram e que relato como anedotas porque não sei se são literais. São, no entanto, todos eles reveladores e, mesmo que divertidos, mostram o lado mais humano da Maçonaria, raramente destacado. É o caso da conversa que tive com o Guarda Externo numa Loja inglesa da capital, simpático velhinho que me acolheu à porta quando os fui visitar e depois não vi mais, uma vez começada a reunião; tendo-o reencontrado só no final, do lado de fora, percebendo só então que Guarda Externo significa isso mesmo: vai à sua Loja para não entrar! Fica do lado de fora! Na minha Loja e no meu Rito não é assim. Falo também de ocasiões em que visitei os trabalhos de outras Lojas fora de portas e onde aprendi muito. Nesse sentido há uma vertente auto-biográfica, embora não seja propositada. Tentei escrever de modo a que os meus leitores se consigam rever nas minhas palavras, de dentro para fora, como Maçon e não como Profano. Por isso há muitas passagens pessoais. É o livro mais pessoal que escrevi sobre este tema. Talvez por isso tenho tido reacções tão positivas. Em geral os meus leitores sentem a distância entre o autor e o leitor. Quando me dizem que leram um livro meu, mostram uma abstracção ao tema do livro e sei bem quando os levei a conhecer temas em que estão “sem pé”. E isso é bom. Quero levá-los onde habitualmente não vão. Foi o caso da “Maçonaria Desvendada” e do “Bestiário Maçónico”. Mas com o Calepino tenho tido reacções muito diferentes. São mais calorosas, mais pessoais, falam-me de passagens mais concretas, de que gostaram e querem saber mais. É um livro que liga a um nível mais emocional do que intelectual. Isto apesar de algumas passagens que contêm muitos níveis de leitura.

Publicas algumas das Pranchas que apresentaste em Loja ao longo dos anos. Queres destacar alguma?

A maior parte das minhas Pranchas nasceu em Calepinos. São o resultado de reflexões muito pessoais. Depois de as ter maturado em manuscrito, passo-as ao “papel” no Word e organizo as ideias de modo a podê-las expor para que sejam entendidas. Algumas das Pranchas são complexas e têm os tais níveis de leitura. Nem todas são directas e transparentes. Aprendizes irão experimentar leituras muito diferentes de Mestres ou mesmo de graus mais adiante. É o meu modo de escrever. Mas há Pranchas mais descritivas, factuais e acessíveis. Escrevo muito sobre a vertente histórica, sobre o simbolismo, o cristianismo e o hermetismo, que são assuntos que eu gosto de abordar de forma directa, aberta, desassombrada e simples, para quem tem conhecimentos elementares. Outras Pranchas passam totalmente ao lado de quem estiver a ler sem a atenção totalmente focada. O longo parágrafo que abre “A Liga do Embuçado – Portugal e a Missão do Porvir” deixou um silêncio pesado quando foi lido pela primeira vez. Um leitor recente, que tinha estado na apresentação original, há quase 10 anos, veio-me agora dizer que finalmente compreendeu o parágrafo! Mas se tivesse de destacar uma Prancha sobre um tema nunca abordado e com elementos inovadores é a “Maçonaria, Artes Cénicas, Ilusão e Magia”, que explora a influência do Teatro, da Ópera e do Ilusionismo no desenvolvimento do ritual maçónico, com interessantes exemplos. Deu-me muito gozo pesquisar o tema.

Publicas também uma Prancha que não é tua. Queres falar sobre ela?

Sim, publico um trabalho único, muito criativo e que ocupa um lugar especial no meu coração. A partitura de uma peça musical escrita pelo compositor Pedro Teixeira da Silva como trabalho de grau, intitulada “São Jorge”, mais tarde estreada na Igreja da Graça em Lisboa pela Orquestra Círculo de Música de Câmara, que pode ser vista aqui:

A peça foi oferecida pelo autor à Grande Loja Unida de Portugal, que a adoptou como seu hino, tendo a Grande Loja pela mão do seu Grão Mestre José Manuel Moreira e o autor Pedro Teixeira da Silva autorizado a publicação das partituras. Embora haja um número significativo de músicos e compositores ligados à Maçonaria em Portugal – mesmo os contemporâneos, em todos os géneros – é invulgar conhecer peças musicais compostas para a Maçonaria, especialmente como trabalho de grau. As partituras contêm as anotações sobre as melodias e movimentos e seus significados e são precedidas pela explicação do próprio autor. Esta originalidade justifica inteiramente a sua inclusão, que é a todos os títulos histórica.

O Glossário poderá ser utilizado para escrever Pranchas de Grau? Não tens receio de ser copiado por Aprendizes preguiçosos, que ficam com o trabalho facilitado, mas depois não vão citar a fonte?

Não, podem copiar à vontade! Na realidade eu não sou um autor muito bom para copiar, porque escrevo de tal modo que o meu texto é um ponto de partida e não um lugar de chegada. Ou seja, lendo as entradas no Calepino, fica feito o trabalho de base, que permite nortear outras leituras e pesquisas. É um veio que estrutura o pensamento e ajuda a destrinçar o que mais se venha a ler. Mas citar-me é um pouco inútil. Procuro ser um autor que abre caminhos em vez de ser uma vitrina de museu onde as coisas velhas são exibidas, muito alinhadinhas, com etiquetas que dizem “este objecto é ISTO”. Não quero que os meus leitores encontrem, como me acontece com alguns autores que não aprecio, becos sem saída. As minhas páginas não são o lugar de destino. Não são catálogos de definições e finitudes. Não. Quero que as minhas páginas sejam abertos e amplos Campos Elísios onde os meus leitores corram, rolem na erva e se apaixonem! Isso sim. Campos abertos em vez de becos sem saída. Lugares de partida em vez de gargalos doutrinais. É assim que procuro escrever.


O “Calepino Maçónico” não está à venda em livrarias.

PEDIDOS PARA: incursoeshermeticas@gmail.com

Convento dos Capuchos 2023

O Convento dos Capuchos na Serra de Sintra é um dos locais mais surpreendentes e improváveis que conheço. Talvez por ser a expressão mais genuína da espiritualidade franciscana, longe da ostentação e do conforto de outros cenóbios mais “acomodados”, mostrando uma verdade espiritual difícil de explicar por palavras. É isso mesmo: ali vive-se a revolta de São Francisco. Intensamente. Ver hoje aquelas celas diminutas, o frio húmido da pedra, os corredores tortuosos, a simplicidade da natureza e o amor ao que é da terra pura, desafia o nosso entendimento. Ouço turistas dizer “que pobres eram, que falta de juízo viver assim!”, mas estão enganados.

O convite é esse: vir a apreender o Convento dos Capuchos de Sintra com TODOS OS SENTIDOS. Os 5 habituais, mas também aquele mais além, que nos poderá abrir o entendimento sobre a realidade espiritual dos seus senhores. Falaremos da história, de D. João de Castro, de lendas, demónios e tempestades, de iniciação e noviciado, do passado bem presente no espírito do lugar.

29 de Julho, 14h; Visita: 20€ + entrada nos Capuchos*

Inscrições: incursoeshermeticas@gmail.com

* Nota: Ver preçário em parquesdesintra.pt já que se aplicam reduções e excepções ao preço normal de 6,65€, dependendo do caso.

A Propósito da Morte da Vergonha (II)

Esta 6ª feira jantei com amigos e amigas de várias procedências maçónicas. O JZ trazia consigo um livro admirável: “100 anos de História” de Emídio Guerreiro.

Emídio Guerreiro, incontornável personalidade das Matemáticas Portuguesas e da Política, pela sua inabalável oposição à ditadura, mais tarde Deputado no Parlamento Português, era um respeitadíssimo Maçon do Grande Oriente Lusitano. Conheceu, como ele dizia, 3 séculos: o 19 (nasceu em 1899), o 20 e o 21 (passou ao Eterno Oriente em 2005). Uma vida de guerreiro, de defensor da justiça e da liberdade, passou pela a prisão política ao tempo do Estado Novo (1932) tendo fugido do Aljube e transitado clandestinamente para Espanha onde acabou por ser preso pelas tropas de Franco em Vigo em 1936, destinado a enfrentar a morte por fuzilamento. A sua vida é salva pelo Consul da Inglaterra em Vigo, Mr. Huxley em circunstâncias que nos interessam. Guerreiro fez-lhe um “sinal especial” e o Inglês, que era Maçon como Emídio, abriu-lhe o caminho da liberdade e do exílio – livre – embarcando-o às escondidas num navio de guerra Inglês que estava no porto de Vigo e se dirigia a Gibraltar e depois França (ver o vídeo notável abaixo). Ali ficaria até 1974 quando regressou a Portugal.

Recordo este homem ímpar e o vídeo do Arquivo da RTP porque ele mesmo fala do silêncio criminoso das nações europeias durante a Guerra Civil Espanhola, enquanto os fascismos cresciam e se enraizavam pouco tempo antes de mergulharem todo o Velho Continente no genocídio da II Guerra. O tema das minhas reflexões “A Propósito da Morte da Vergonha” entronca aqui. No já referido silêncio dos inocentes, a complacência dos que passivamente olham e não se envolvem quando o desprezo pela liberdade e pelas regras são flagrantes, mas não tanto que nos incomode de perto.

Emídio Guerreiro não foi o único Maçon salvo por ter feito “o sinal” e ser reconhecido. Há casos documentados na Guerra Civil Americana de irmãos de facções contrárias que, vendo-se em aflição, se valeram uns do outros e se salvaram juntos. Inimigos na guerra, mas irmãos até ao fim. O próprio Consul da Inglaterra em Vigo colocou o seu lugar em risco, senão mesmo a sua pessoa, ao ajudar o Maçon foragido Emídio, que reconheceu pelo “sinal” e cuja confiança não pôde trair.

Sobre isto falávamos no jantar. Sobre esta admirável fraternidade que ultrapassa linhas inimigas, antagonistas inconciliáveis, a sede pelos éditos que visam eliminar a voz dissonante. A supressão do outro como única condição de sobrevivência. A Maçonaria como a instituição capaz de resolver o “ou estás com eles ou estás comigo, porque se não estás comigo, estás contra mim”. Emídio não estava com o Consul Inglês, até porque pertencia a uma Obediência laica, que a deste não reconhecia. Mas a fraternidade supera todas as dificuldades e todos os pretextos. Emídio sabe que sobreviveu ao pelotão de fuzilamento porque “deu o sinal”. Sobre isto falávamos no jantar.

Foi então que alguém à mesa disse tudo: “Isso eram Maçons de outros tempos, meu caro. Tinham valores. Hoje ‘fuzila-se’ o irmão da própria Loja e ninguém protesta.”

Fez-se um silêncio pesado.

Um silêncio de inocentes.

A Propósito da Morte da Vergonha (I)

Regresso às minhas reflexões “a propósito”, depois de dois anos de uma saudável preguiça sem muita actividade de nota. Destacam-se “A Propósito da Morte de Olga Prats” onde recordo um episódio da minha vida maçónica pretérita e “Também a Propósito da Reportagem «Segredos Maçónicos» da RTP1” de 2020 onde tenho uma fugaz aparição, o que motivou da parte dos meus amigos muitos comentários e perguntas a que procurei responder no post. Talvez este último comece a precisar de alguma revisão aqui e ali, mas lá chegaremos, se for o caso.

Hoje sento-me ao teclado para pensar a propósito de outro assunto. Há uma citação que é habitualmente atribuída a Martin Luther King Jr. mas que na realidade tem uma origem muito anterior, por vezes também atribuída ao Maçon setecentista Irlandês Edmund Burke (possivelmente de forma apócrifa), cujo conteúdo transcende as épocas e as geografias:

The only thing necessary for the persistence of evil is for enough good people to do nothing

Já tenho lido a versão Portuguesa ligeiramente editada como “Para que o mal triunfe basta que os justos mantenham o seu silêncio”.

A atribuição é dúbia, a citação original parece ter-se perdido, mas o facto de viajar no tempo e vir à superfície frequentemente mostra a relevância do seu conteúdo quando somos confrontados com a prepotência do mais forte sobre o mais fraco.

A citação foi recordada por John Stuart Mill em 1867, também foi usada por John F. Kennedy em 1961 para caracterizar a passividade de muitos Alemães durante a II Guerra face ao Holocausto, igualmente recuperada por Martin Luther King Jr ainda durante a mesma década para sublinhar o silêncio dos que viam a descriminação racial e a normalizavam pelo silêncio, foi campeã de impressões no Facebook sempre que mais um massacre acontecia numa escola Americana ou um negro era morto pela polícia em Minneapolis, só para recordar alguns.

O abuso de poder e de posição dominante é uma das caraterísticas de líderes débeis e incapazes, substituindo pela força e pelo flagrante incumprimento dos seus deveres ou das convenções a que livremente aderiram, pela lei ditada caso a caso e de modo arbitrário. Fazem-no porque contam com o medo e a conivência dos “justos que mantêm o seu silêncio”. É de tal modo vulgar e de tal modo frequente que afecta as organizações humanas regularmente quando a escolha dos líderes se faz entre os medíocres, por falta de alternativa.

Na Maçonaria Portuguesa o fenómeno é de tal modo regular e padronizado, porque as causas se mantêm sem mudança há anos, que eu mantenho desde pelo menos 2001 um registo dos “processos de intenções”, “perseguições internas”, “inquéritos disciplinares” e finalmente “expulsões” relativos à maioria das Obediências, já que ninguém escapa a ter, uma vez por outra, um esquizofrénico ao comando. Já este ano a Maçonaria foi notícia nos jornais regionais. Ameaças de expulsões, ataques à liberdade de associação, acusações “entre calúnias”, um fartote, contra os irmãos e irmãs de uma cidade da região centro tão bela e de tão boa gente, de que Lisboa se esquece tantas vezes… Felizmente houve quem tivesse bom senso. Mas os esquizofrénicos são os mais divertidos, porque se assustam até com a sua sombra e têm a mania que os outros não fazem mais nada na vida a não ser persegui-los! Lembro-me de um, que reunia ali para os lados de São Bento, cujos 1ºs Vigilantes eram sistematicamente expulsos quando estavam a meses de poder ser Veneráveis Mestres. Aliás, basta olhar os casos, a posição de 1º Vigilante é a que apresenta a maior “mortalidade maçónica” de todas. Precisamente por ser uma porta de acesso à Cadeira. Também aqui, em geral, a saída de um proscrito é obtida à custa do silêncio dos que, não concordando com as motivações arbitrárias emanadas das mais altas esferas, se escudam no receio de poder acontecer o mesmo com eles. E fatalmente, porque nada muda, acontece…

Em muitos casos as Regras, Estatutos e outros documentos internos não servem para nada. Divirto-me sempre que sou convidado a visitar uma Loja de uma qualquer Obediência e se discute o Regulamento Interno. A coisa mais inútil jamais inventada pela Maçonaria especulativa. Porquê? Ninguém se lembra que existe. São sessões e sessões a ler artigos e a consagrar intenções e comportamentos e depois, quando aparece a ocasião prática de os aplicar, há sempre um motivo, uma “autoridade superior”, um pretexto urgente para fazer outra coisa completamente diferente e a “talhe de foice”.

Note-se que não falo de casos concretos, para que não me venham acusar de interferência em assuntos internos de ninguém. A probabilidade de que alguma das mais de 20 Obediência Maçónicas em actividade em Portugal esteja a passar por apertos, precisamente neste momento, é muito grande. Por isso as minhas palavras fatalmente se aplicam a alguém, mesmo que eu não conheça o concreto das situações. Isso deve-se à ciclicidade do fenómeno em si e não a que eu o refira agora! Não estou a falar de ninguém em concreto. A sério. E posso comprová-lo! Fez este ano 10 anos que publiquei o meu livro “A Maçonaria Desvendada – Reconquistar a Tradição” (Editora Zéfiro; zefiro.pt), que diz às páginas tantas:

“A Maçonaria é erradamente usada como um universo de substituição, em que os que não têm poder no mundo profano se transformam em tiranozinhos insuportáveis e perigosos. (…) A ascensão de alguns líderes de estruturas maçónicas é inversamente proporcional ao êxito na sua vida privada pessoal e profissional. Longos conflitos laborais, ou com entidades reguladoras e fiscais (…) decorrem em tribunal causando grande impacto na auto-estima destes, precisamente ao longo do período em que lutam com mais afinco por ascender socialmente a escadaria de “poder” e “validação” da Maçonaria. Quando os tribunais [não lhes dão razão] (…) e pun[em] ou afasta[am] aqueles homens devido à sua comprovada incompetência ou desonestidade profissional, a terapia faz-se na Maçonaria e lá os vemos, de aventais, jóias e sautoirs – novos chefes – de feridas lambidas e anestesia geral (…) As estruturas a que presidem só avançam quando eles se forem. E isso pode demorar anos.

Aguçada a ambição, afagado o ego, redescoberta a dignidade que o mundo profano se recusa a dar – ganho o lugar de poder de malhete e espada na mão – o humilde torna-se arrogante.”

Luis de Matos (c) 2011/2021

Portanto, tendo escrito estas palavras em 2011, tendo já então conhecido alguns “tiranozinhos perigosos”, fica claro que o que me interessa é o fenómeno em si e não os intérpretes de ontem ou de hoje. Aliás, há muito fiz a minha paz com este assunto, porque sei como acabam estas crises para os tais “tiranozinhos”. Até ao momento o GADU não falhou em lhes dar uma valente lição sempre que quis (e que nem sempre lhes basta, diga-se), pelo que eu, quando sinto a mediocridade sem oposição a vir à superfície, ponho-me ao largo e espero.

Ora, “estar ao largo”, uma das muitas expressões idiomáticas que herdámos das Descobertas, não significa estar em silêncio. Não costumo contar-me entre os que se calam deixando o mal triunfar. Falo, mas falo de outra maneira e de outra posição. E isto hoje basta. Amanhã veremos.

Desde a publicação do meu livro há mais de uma década tenho tido o prazer de contribuir para o avançar do ideal maçónico em várias Lojas e Obediências, de forma quase sempre discreta mas decisiva. Lembro iniciativas relevantes em Nova Iorque (onde tive residência profissional) no contexto da Tradição Willermoziana, em Espanha em diversos contextos, incluindo a difícil situação da irregularização da GLNF entre 2008 e 2012 (por culpa de um “tiranozinho”!) a que pertencia em Madrid na época, bem como várias Obediências em Portugal com as quais sempre mantive – e mantenho – a maior cordialidade e as quais ajudei sempre que considerei poder estar ao serviço. Repito, desde 2011. Não é um posicionamento de modas que adoptei há um par de meses.

Assim, é com tristeza que vejo o valor sempre corrente da frase “Para que o mal triunfe basta que os justos mantenham o seu silêncio”. Seja ela da autoria de Edmund Burke ou de António Aleixo.

A resposta da mente reptiliana pelo “atacar ou morrer” quando o nosso ego está em causa é um dos vícios a que se cavam masmorras em Maçonaria. A atitude “ganhar ou morrer” já trouxe mais morte e retrocesso do que vitórias, sempre que aquilo pelo que se luta não tem nem mérito nem relevância para lá do nosso umbigo. Percebi isso cedo no meu percurso.

Deste modo compreendo perfeitamente aqueles que, apesar de não terem a razão suficientemente madura para travar a soberba do seu Cro-Magnon atávico, dão por si em posições de poder e o exercem sem maiores considerações pelos valores que defendem com o lado direito dos lábios, mas esmagam com o polegar da mão esquerda. Esses eu compreendo.

O que não compreendo é o silêncio dos bons.

PS: Vou falar com os amigos do “Assunto Sério” para fazermos um Podcast sobre isto!

A propósito da morte de Olga Prats

Morreu a pianista Olga Prats - SIC Notícias

Excerto de uma auto-biografia inédita sobre a minha ligação à Maçonaria, ainda e curso e sem data de publicação. Em 1992 Olga Prats deu um recital durante uma Sessão Magna da Grande Loja Regular de Portugal que me ficou na memória. Este excerto conta um pouco do sucedido, com uma pequena confusão feita com o nome do “Opus Ensemble”. Cá vai.


“A sessão de Magna de Equinócio de Outono de 1992 da Grande Loja foi uma ocasião festiva da maior importância. Lembro-me de que tinha sido nomeado Grade Experto no início de Setembro, a minha primeira posição como Grande Oficial, o que era um peso grande nos ombros (e um lindo avental azul-escuro debruado a ouro à citura). Depois de uma conversa no gabinete do Grão Mestre Fernando Teixeira fiquei com a incumbência de documentar as diferenças de reconhecimento entre os vários Ritos.

Vamos por partes.

Quando um Maçon se apresenta em visita a uma Loja de que não faz parte, é função do Irmão Experto (de “expert”, o “especialista” e não esperto, de “armado em…”), fazer o telhamento. As reuniões Maçónicas, por se realizarem em privado (“a coberto”), requerem que se verifique que aqueles que estão presentes têm as devidas qualidades e graus, pelo que aferir essa “cobertura”, como a palavra indica, é fazer o “telhamento”. Assegurar de que só esteja sob a telha ou o telhado quem, de facto, pertence à Ordem.

O telhamento é feito pelo recurso aos sinais, palavras e meios de reconhecimento dados aos Aprendizes no dia da sua iniciação. É algo que todos os Maçons têm obrigação de saber. São muito similares entre os vários Ritos, variando algumas das palavras de pormenor. A identificação destas variações não estava sistematizada, de modo que entendi que o Grão Mestre me nomeara Grande Oficial para fazer um trabalho de levantamento e, por ser Grande Experto, assegurar-me do telhamento dos visitantes estrangeiros que iriam estar na Sessão Magna, provenientes de vários países, continentes e Ritos. Tarefa pesada, a realizar e, poucas semanas.

Já não sei precisar, mas estiveram dezenas de Grão Mestres e suas comitivas, que iam confirmando a presença para a Grande Secretaria à medida que a data se aproximava. O Grande Secretário esforçava-se para me dar informações sobre o Rito de origem de todos os que vinham a Portugal. Muito rapidamente se foram acumulando confirmações do Rito Escocês Antigo e Aceite (da Europa) e do Rito Escocês Antigo e Aceito (diferença de pormenor, não obstante diferença a não ignorar!) de vários Estados do Brasil. Depois do Rito Escocês Rectificado (o meu, que conhecia bem), do Rito Francês, do Rito de Emulação, a que se juntou uma delegação do Rito de Schröeder e assim por diante. No espaço de dias preparei uma tabela de referências, questões e reconhecimento para poder questionar cada convidado e sobre a sua qualidade.

A festa seria em grande. Um andar completo do antigo Hotel Estoril Sol foi reservado e, nos dias anteriores à sessão, transformado num magnífico Templo Maçónico que iria acolher mais de 450 pessoas. A sumptuosidade da decoração sublinhava a solenidade. Algumas das Grandes Lojas presentes enviavam representantes pela primeira vez e a força da nascente Maçonaria Regular Portuguesa era notada internacionalmente. O Grão Prior Geral do Grão Priorado da Helvécia reunia em Mafra com um grupo inicial para preparar a criação de um Grão Priorado do Rito Escocês Rectificado em Portugal, falando-se ainda em outros círculos da possibilidade do apoio do Supremo Conselho do Grau 33º Jurisdição Sul dos Estados Unidos à criação de um futuro Supremo Conselho em Portugal.

Eram tempos de enorme entusiasmo no seio da Grande Loja, que crescia em número e qualidade.

Naquela ocasião fez-se a primeira Sessão Branca de Grande Loja, com a presença das Senhoras (bem como filhos e filhas de Maçons). Alguém se terá lembrado de falar com o Irmão Luis Prats da RL Mestre Affonso Domingues, renomado médico Psiquiatra, para sondar a possibilidade da participação da conhecida pianista Olga Prats, do Opus Ensemble, sua familiar, para fechar a Sessão Magna com um Recital que seria seguramente apreciado pelas delegações estrangeiras presentes, bem como por todos os Irmão Portugueses e suas famílias.

Duas notas antes de avançar. Uma sobre Luis Prats, que é descrito do seguinte modo no Blog “A Partir Pedra”, da sua Respeitável Loja;

“O Luís Prats foi o nono Venerável Mestre da Loja Mestre Affonso Domingues. No texto que dediquei ao seu veneralato, escrevi, a dado passo, que tinha uma conceção rigidamente esotérica, quase crística, senão mesmo crística da Maçonaria. Para ele, a Maçonaria é essencialmente um método de desencadeamento e evolução de um processo iniciático, tendente à aproximação do Homem ao Divino – um processo paralelo, por exemplo, ao misticismo monástico cristão. Isto é, e se bem interpreto o seu pensamento, o método iniciático maçónico é um dos métodos de aproximação do Homem ao Divino, como o são o dito misticismo monástico ou o budismo. Luís P. privilegiava, assim, o estudo, a teoria, a análise simbólica, tendo porém o cuidado de alertar para os perigos do que costuma designar de “devaneios esotérico-birutas” muito presentes em muita “literatura”, principalmente do século XIX.”[1]

Sobre Olga Prats, diz-nos a sua biografia que foi a primeira pianista a tocar e a gravar o argentino Astor Piazzola em Portugal e a divulgar o fado ao piano, nomeadamente as partituras de finais do século XIX e primeiras décadas do século XX de compositores como Alexandre Rey Colaço ou Eduardo Burnay. Ao longo dos quase 70 anos de carreira, a artista privilegiou a música de câmara, destacando a produção contemporânea. Começou a tocar piano aos 6 anos dando o seu primeiro recital em adolescente, aos 14 anos, no Teatro Municipal de S. Luiz, em Lisboa. Fez o Curso Superior de Piano no Conservatório Nacional onde tinham sido alunas a sua mãe e uma tia, e um bisavô professor. Ao terminar o curso em 1957, prosseguiu os estudos em Colónia, na Alemanha e em Friburgo, na Suíça. Olga Prats foi uma das fundadoras do Opus Ensemble, em 1980. Em 2008, o Estado português reconheceu a excepcionalidade da sua carreira e o seu contributo para a Cultura portuguesa, tendo-a feito Comendadora da Ordem Militar de Santiago da Espada.

Preparava-se assim um dia memorável.

Ao início da tarde as numerosas delegações estrangeiras foram-se reunindo numa sala com uma magnífica vista da baía de Cascais, preparada para que se pudessem paramentar condignamente. Ainda me lembro bem do Grão Mestre da Grande Loja de Espanha, Luis Salat Gusils quando o abordei no intuito de fazer o telhamento. Acabara de colocar o seu colar de Grão Mestre e olhou-me com ar divertido. Escolhi-o por falar um pouco melhor espanhol do que francês ou italiano. Sem delongas prestou-se ao exercício:

Eu: Hermano mío, de donde viens? (num portunhol característico, mas sem vergonhas)

Ele: **************

Eu: Dá-me a tua manu… Te voi a pedir o toke.

E assim por diante. Fiz um telhamento rigorosíssimo! E ele divertido, respondeu e agradeceu.

Seguiu-se um Grão Mestre de uma Grande Loja Americana, de que não me recordo. Foi um pouco mais difícil, porque eles se baseiam mais nos sinais e toques e menos nas perguntas e respostas. Mas adaptei-me bem e passei ao seguinte, um Grande Inspector do Grande Oriente do Brasil. Sempre de cara cerrada, fiz o meu papel com todo o rigor. Com ele a coisa não correu tão bem, porque se atrapalhou e nem sinais, nem toques nem palavras. Perguntei-lhe qual era o Rito dele, para ver se facilitava, mas respondeu “Rito Maçônico, né?”, o que só contribuiu para a confusão. Todos os Ritos são maçónicos… Fiz-lhe então algumas perguntas mais básicas (“a que horas começam a trabalhar os Maçons”, “a que horas terminam”, “onde se senta o venerável Mestre”, etc.). Lá consegui fazer um reconhecimento básico.

Passei ao Grão Mestre Interino da Grande Loja Nacional Francesa, Claude Charbonniaud, que eu já conhecia. Fazer um telhamento em Francês não é fácil, especialmente quando se trata do Grão Mestre de uma das Grandes Lojas com mais Ritos e alguém muito conhecedor da Ordem em todas as suas vertentes. Num dado momento, quando lhe disse que era do Escocês Rectificado e que tinha sido iniciado na sua GLNF, vi-me na desconfortável posição de ser Frére Charbonniaud a telhar-me a mim! Ele virou o bico ao prego e fez-me recitar quase toda a primeira secção do Catecismo do RER que conhecia de cor, melhor do que eu! Logo que pude, aliviado, passei a outro convidado.

Estava eu nisto quando veio falar comigo a correr o nosso Assistente do Grão Mestre Mestre, Irmão JCN, mandado pelo Grão Mestre Fernando Teixeira:

AGM: Luis, o que é que estás a fazer?

Eu: Estou a telhar os convidados.

Chamou-me à parte:

AGM: Estás doido? São Grão Mestres, pá! Não se vai fazer um telhamento a Grão Mestres! São nossos convidados! Se eles não forem reconhecidos, quem é que é?

Eu: Desculpa, essa é a minha função como Grande Experto. Ordens do MRGM.

AGM: Deves ter ouvido mal! Foi ele que me mandou vir aqui para que estejas quieto! Ordens do Grão Mestre. Pára já com isso. Não podes telhar Grão Mestres nem Grandes Oficiais porque podem não saber responder! São nossos convidados e ponto final. A gente já lhes reconhece a qualidade. Não achas?

Eu: Er… Então para que é que temos um Grande Experto?

AGM: Para ver se a Grande Loja está coberta. Mas houve alguém que se queixou.

Eu: A sério?! Até agora não tive problemas. Só o…

AGM: Não interessa. É para parares com o telhamento! Não se faz telhamento a Grão Mestres! É uma ordem. Vai ajudar o Grande Secretário com as inscrições para o jantar. Deixa os Grão Mestres em paz.

Eu: Peço desculpa. Talvez tenha sido zelo a mais.

E foi, claro. Ainda novinho nestas coisas, levei a função muito a sério. Ainda não sabia que não era suposto. Pensando que não eram títulos para pendurar ao peito, mas funções a desempenhar, acabei por dar de caras com quem sabia ainda menos do que eu e que representava ali milhares de Maçons do seu país. O erro foi – é claro – meu.

O que é curioso – e ainda hoje me lembro – é que os Grão Mestres que conheciam bem a lição entraram no jogo, uns mais divertidos, outros levando a coisa a sério e esforçando-se por responder e outros, como Claude Charbonniaud, mostrando-me que, naquele nível, eu não podia esperar telhar sem ser telhado. Não podia exigir rigor sem me submeter eu mesmo ao rigor. O que fiz. Naquele dia aprendi imenso. Quem se exalta, será humilhado.

Nunca mais estive numa Sessão de Grande Loja onde se fizesse um telhamento. Talvez isso explique o modo como muitas vieram a correr. No final do mandato do Grão Mestre Fernando Teixeira passei a Grande Oficial Ad-Vitam e não se falou mais no caso. Também não aceitei mais convites para Grande Oficial em nenhuma Obediência, não vá eu enganar-me e pensar outra vez que é para ser a sério.

A Sessão Magna foi memorável e irrepreensível a todos os níveis. Foi uma festa de fraternidade e uma demonstração da força que a Maçonaria Regular convocava consigo em 1992 e continuariam em crescendo por mais alguns anos. O Recital de Olga Prats ao piano, instalado junto ao Oriente, foi dos momentos mais belos de que me recordo nesses anos iniciais da Grande Loja. A música tem o dom de nos elevar de uma forma excepcional, tal como todas as artes. Mas no caso do piano, há algo de imanifestado e impalpável que só o tímpano e o coração descodificam. Quando essa ligação metafísica se dá por intermédio da expressão de um talento como o de Olga Prats, passamos a estar num patamar ainda mais elevado. A recordação ficou, indelével.

Mas a noite não acabaria sem mais uma peripécia. Ao preparar o pagamento dos artistas e rider técnico, o Grande Secretário, já seguramente cansado, em vez de passar o cheque da Grande Loja à ordem do “Opus Ensemble”, passou-o ao “OPOS DEI”. Foi,  com toda a certeza, o único cheque da Maçonaria Portuguesa àquela Prelatura da Igreja Católica.

É claro que o cheque teve de voltar para trás e ser passado de novo, agora sim ao destinatário certo. Mas o original, em erro, ainda andou lá uns meses, emoldurado, na Grande Secretaria para quem o quisesse ver. “Page-se ao Opus Dei.”

(c) Luis de Matos 2009-2021


[1] a-partir-pedra.blogspot.com, por Rui Bandeira”

Também a Propósito da Reportagem “Segredos Maçónicos” da RTP1

1. O HORROR

Não tenho recordação de nenhuma reportagem feita por uma televisão nacional que tenha tido o impacto de “Segredos Maçónicos” exibida pela RTP1 no seu Linha da Frente a 6 de Fevereiro de 2020. O meu telefone não descansa, o meu mail está cheio, os serviços de messenger estão em overload. Os meus amigos e muitos dos meus leitores querem saber como é que apareci na reportagem e muitos se perguntam o que faço na Nova Maçonaria Portuguesa (assim se apresenta a Soberana, a Grande Loja que abriu as portas às câmaras). Tenham lá calma. Estive no ar 20 segundos!

Talvez seja boa hora de colocar alguns assuntos em dia.

De facto a reportagem é controversa. Mesmo o Grão Mestre da Grande Loja Soberana publicou no site da Obediência uma mensagem de fundamentação de algumas das opções seguidas ao abrir a sua sede, porque mais vale esclarecer e enquadrar do que deixar à imaginação de cada um o que terá a RTP filmado de uma sociedade tão secreta como a Maçonaria! E chamo-lhe controversa pelas reacções, adversas na sua maioria pela parte de Maçons e favoráveis pela parte do público, especialmente do meu público leitor que já está habituado a saber que pouco do que é maçónico fica hoje escondido. Mais sobre isto adiante.

E as reacções surpreenderam-me porque, em quase 30 anos de Maçonaria, já vi reportagens portuguesas dentro de rituais maçónicos, totalmente filmados de ponta aponta (a célebre reportagem da RTP em 1992 no Hotel Estoril Sol em reunião magna da então Grande Loja Regular de Portugal), várias reportagens nos Congressos que por cá se realizaram com acesso à parte litúrgica, até uma reportagem para um canal privado novamente no Estoril Sol em 1996 por ocasião da tomada de posse do Grão Mestre da GLRP. Lá fora então, recordo-me de tudo, desde a reportagem completa da comemoração dos 275 anos da United Grand Lodge of England em 1992 em Earls Court até à mais recente comemoração dos 300 anos com um ritual que teve lugar no Royal Albert Hall em 2017 – tudo filmado, é procurar no Youtube.

Ou seja, a internet veio colocar uma lupa sobre Maçonaria. Não apenas no que respeita às fotografias, livros, rituais, informação verdadeira e falsa, mas igualmente nas plataforma de vídeo como o Youtube ou Netflix e nas redes sociais.

Assim, podemos dizer que há dois tipos de Maçonaria no mundo hoje: as que estão em negação e pensam que podem viver à parte, sem escrutínio, sem que a curiosidade que incentivam com um secretismo mal explicado exija uma abertura à sociedade que dizem querer mudar e as que fizeram uma longa introspecção e, não desejando ser varridas para debaixo do tapete das irrelevâncias históricas e curiosidade museológicas, abraçam o novo mundo e a revolução digital sem comprometer os valores e o direito à privacidade que essa revolução veio por na ordem do dia. E destas, seguramente que a Grande Loja Unida de Inglaterra e algumas Grandes Lojas Americanas têm tomado uma dianteira que iria chocar 90% dos que se me têm manifestado nos últimos dias por causa do Linha da Frente. Quem ficou na estação e viu o comboio partir é capaz de ficar abalado com o título do Irmão David Staples da United Grande Lodge of England.

Um exemplo curto:

Há uma enorme falta de informação e ligação à actualidade. Estamos a ficar para trás. A marcar passo. Outro exemplo do que se faz lá fora:

Então e Portugal? Tem a Maçonaria conseguido fechar portas e manter os Templos e os rituais escondidos?

Como autor, tenho a obrigação de dar aos meus leitores informação fidedigna. Reclinem-se nas vossas cadeiras ou deixem o que se segue para ouvir a caminho do trabalho no vosso telemóvel. É extenso. Não é a primeira vez que a Maçonaria “abre as portas”. A presente Reportagem deve ser comparada com o que já foi feito.

Querem fazer comigo uma viagem à avenida das memórias?

Cá vai:

Avivou a memória? Abrem-se Templos, explicam-se símbolos, fala-se de história, fala-se paramentado, vê-se tudo, mesmo o que devia ficar reservado, vêem-se cadeias de união, rituais, deambulações na Loja, a música é grave e taciturna, tictacteia-se à volta do segredo (Segredo? Não há segredo! Discrição…), há várias organizações e muita gente diferente. Nem tudo é mau. Mas tudo é meio obscuro, fechado e pretérito.

Atenção que isto é um assunto sério! Até hoje a Maçonaria não percebeu que, se quer fazer parte da Sociedade, tem de fazer a sua parte para que a Sociedade a perceba. E a comunicação é chave. Deve ser positiva, diferenciadora e não deve esperar pelo ruído mediático dos escândalos nem ser feita à custa das rivalidades entre Obediências (que o público em geral, naturalmente, não distingue). Assim tem sido a comunicação maçónica nos meios informativos em Portugal.

Quem conhece estes e outros vídeos, como pode estar a mandar-me, logo a mim, mensagens sobre eu aparecer no Linha da Frente durante 20 segundos? Será que há algo mais subversivo no Linha da Frente, que os não-maçons não apanham?

Será, talvez, que haja quem tenha preferência por isto?

Ou mesmo, isto…

É que, caros leitores, na era digital, do Facebook e do Youtube, não são as Obediências Maçónicas que fazem a agenda. O conteúdo sobre elas é criado livremente por quem precisa de vender clicks. E por gente com a mania da perseguição. E por fanáticos. E até, imagine-se, por membros das Lojas! E é por isso que a revolução digital não se pode ignorar, porque não se vai embora. Veio para ficar.

E ficar! Uma história num jornal online fica para sempre e pode sempre encontrar-se googlando. Boa ou má. Certo, certo, encontram-se mais histórias más do que boas. Mas isso acontece porque é aos Maçons que compete divulgar as boas. E eles não o fazem com frequência. A desinformação online sobre a Maçonaria diz muito da formação dos Maçons e da sua incapacidade para enfrentar a realidade. Coloca-se tudo no Facebook. Há milhares de imagens de cerimónias, templos, Lojas em sessão, paramentadas e em pleno ritual. Partilha-se tudo. E mais uma vez a Grande Loja Inglesa vais à frente. É ver aqui e é só seguir o bom exemplo. Mas não… Vamos fechar os olhos a ver se passa…

Suspeito que o HORROR de que falo acima, o que chocou os muitos Irmãos e Irmãs que me enviaram mensagens, mas também o que agradou aos não-maçons, não foi a abertura dos Templos, nem as entrevistas com avental, nem deixar falar os Aprendizes, nem ver-se uma Loja por dentro. O HORROR foi a tal atitude de “Nova Maçonaria”. Foi o perceber-se que a Reportagem não é uma peça orientada, que o que se vê é genuíno, não é preparado, não é um infomercial, não falam só os chefes, há muitas caras desconhecidas e correntes, gente que se cruza connosco na rua e igual a nós. Foi o assumir-se um preço elevado pela iniciação (tabu bem conhecido), deixar explícito que sem dinheiro não há meios (todos sabem disso, mas fica sempre nas entrelinhas – dinheiro?! Que horror!), mostrar-se um leilão solidário (que muitos também fazem à porta fechada), ver-se que não há pudor em convidar um sem-abrigo a jantar e falar, dizer que impacto as acções solidárias tiveram (muitos também as fazem, mas a sandezinha não é transformadora e iniciativas não são obra), foi a falta na Reportagem de Gestores Públicos, autarcas, políticos, deputados, Secretários de Estado, gente emproada que tem por profissão gerir o nosso pecúlio.

Essa nova atitude, corte radical com as imagens históricas que vemos acima e que eram muito boas no seu tempo, é a realização de que de futuro a Maçonaria tem de estar mais próxima do mundo sem comprometer a sua missão espiritual e transformadora, constituída por gente excepcional pelas suas inquietações e leaders no seu metier, mas não comprometidas com lobbies obscuros ou interesses desfasados dos valores Maçónicos e capazes – repito: CAPAZES – de dar a cara e se fazer conhecer como Maçons. A ruptura com o passado pela celebração da história. Isso é o que instiga o HORROR.

Os tempos andaram para a frente mais de 100 anos nos últimos 15. Já nada é igual e quem não evolui, perde-se na irrelevância.

2 – MAS TU ESTÁS NA SOBERANA?

E apesar da defesa intransigente da Reportagem, não, não sou membro da Soberana. Sou autor de vários livros onde tenho publicada a minha filiação de várias décadas ao Rito Escocês Rectificado e, na última década, à Loja Adhuc Stat!, nº5 do Grão Priorado Rectificado de Hispania.

A resposta é não. Basta ver como sou apresentado.

Foi durante as gravações do Podcast “Assunto Sério” da Soberana, para o qual fui amavelmente convidado para falar sobre assuntos como o Quinto Império, a Geometria Sagrada, o Rito Rectificado, etc., como autor (ver aqui, aqui e aqui) que me pediram para dizer umas palavras sobre Maçonaria. Colaborei com todo o gosto, porque sou neutral em absoluto relativamente à Maçonaria Portuguesa, querendo apenas que ela prospere.

Já colaborei em eventos e iniciativas diversas (debates, palestras, cursos, visitas guiadas, apresentações, etc.) com a maioria das cerca de 20 Obediências Portuguesas, designadamente a Grande Loja Regular de Portugal (de que fui um dos fundadores)/GLLP, Grande Oriente Lusitano, Grande Loja Simbólica (ambas), Grande Loja Unida de Portugal, etc. Sou de fora, equidistante, “igualmente amigo do rico e do pobre desde que sejam boas pessoas”, tenho leitores em todas a Obediências, não me meto em assuntos internos, não comento sobre questões litúrgicas. Único desígnio: que a Ordem prospere. SOU INDEPENDENTE. Para quem sabe ler, está tudo dito.

Ora, isso é visível no forma como fui titulado “Escritor/Maçon” face aos outros intervenientes, com os seus aventais, graus e funções bem explícitos:

Finalmente há um plano em que apareço em modo casual, de polo, frente à mesa de som do Podcast, em claro contraste com todos os outros intervenientes.

Parece-me evidente que é implícito que sou um convidado e não falo em nome de ninguém a não ser eu mesmo.

E o que foi que eu disse nos meus 20 segundos de antena?

“Cada vez que um Maçon, de qualquer lado, se mete em negócios escuros, está a meter todo o nome da Maçonaria em negócios escuros. Portanto ele deve ser punido por isso”.

E ainda:

“Nenhuma organização – nenhuma – de nenhum tipo, associativa por exemplo, [como] os Bombeiros de Sintra ou seja quem for, pode assegurar-se que aqueles que são sócios se portam bem. É muito raro – dos casos todos que nós conhecemos – é muito raro haver um conjunto de Maçons que se juntou [com o propósito de] fazer qualquer coisa que é ilegal; porque se tivesse sido assim, teriam sido presos por associação criminosa”.

Ora, esta posição está já expressa no meu livro “Maçonaria Desvendada – Reconquistar a Tradição”, de 2011. Veja-se o que publiquei aqui sobre o caso Loja Mozart a seu tempo. Por isso nada de novo. No mais não tive intervenção.

3 – MAS TU ESTÁS COM A SOBERANA?

Essa é outra questão. Não sou da Soberana, mas estou com a Soberana como sempre estive com todos os ramos da Ordem Maçónica que trabalham para o seu progresso. Sei que há poucos como eu. Não tenho a pele em nenhuma contenda e comparto o pão à mesma mesa com irmãos e irmãs de todas as tendências maçónicas. Quem achar que me tem, desengana-se depressa. Sou livre. Não participo de nenhuma estrutura de poder em Portugal, por isso nada tenho a ganhar ou a perder nas rivalidades. Não são minhas. Onde houver bom e seguro trabalho Maçónico, se o GADU assim entender, eu estarei lá. Assim, estou com a Soberana.

Maçonicamente filiei-me há anos à família Rectificada espanhola por afinidades espirituais e por ter trabalhado como CEO de uma companhia em Madrid muito tempo. Não desejo deixar essa filiação num Regime que me agrada e que entendo como uma jóia excepcional. Mas é esse meu compromisso que me leva a aceitar os diversos pedidos de ajuda e informação, conselho e apoio que me vão chegando de todos os amigos que fui fazendo na Ordem. E por isso, quem estranhe que a minha amizade fraternal com o Grão Mestre João Pestana Dias me leve a acompanhar de perto o seu trabalho e o que a Soberana está a fazer, apenas me deve contactar e convidar-me para os seus debates, Podcasts, visitas guiadas e o mais, que eu lá estarei igualmente com prazer. Não faço descriminações. Sou Independente. Sou largo e pesado e chego para todos! Não vale a pena cenas de ciúmes.

A esta minha atitude fraternal para todas as Obediências, adiciona-se o facto de o Grão Priorado a que pertenço ter assinado um Tratado de Amizade com a Soberana há poucos meses, por iniciativa do seu Grão Mestre Diego Cerrato, que é muito judicioso e prudente nestas coisas e que escrutinou em detalhe a Obediência antes de nos permitir (à Loja a que pertenço) usar as instalações desta para reunir. Já reunimos em outras instalações e nunca tive as perguntas e reacções de surpresa que recebi agora!

Ou seja, não pertenço à Soberana. A Loja – estrangeira – a que pertenço reúnem em espaço gentilmente cedido por esta. Em outras organizações de carácter fraternal em que estou, tenho uma relação próxima com muitas outras Ordens e Obediências que prezo muito. Nas Jornadas Templárias em Lagos do ano passado esteve a meu convite um Grão Mestre Adjunto do Grande Oriente Lusitano e o Grande Conselheiro da maior organização Rosacruciana Portuguesa. Templos e lugares de reunião têm sido gentilmente cedidos por Lojas e Associações que têm Irmãos na sua composição em todo o país para um largo leque de actividades. É ver a minha agenda para ter noção das que são públicas.

4 – A NOVA MAÇONARIA PORTUGUESA

Pois, aqui é que está o nó.

Tal como em todas as situações em que o hábito se sobrepõe à finalidade, há vários incumbentes que vão repetindo padrões de comportamento que os isolam do ambiente em que vivem e os alheiam do desígnio, até que uma formulação disruptiva apareça e venha actualizar os meios e os métodos, repondo a finalidade. Historicamente, os gigantes que não se adaptam encontram a irrelevância e definham lentamente. Em geral os incumbentes combatem os disruptivos em vez de fazerem uma auto-análise e darem um passo em frente. Foi assim que a Igreja acendeu as fogueiras da Inquisição na sua Contra-Reforma em resposta às questões levantadas por Lutero e outros. Quem quer manter o status nem sempre saber reagir e crescer quando muda o “quo”. Mas há notáveis excepções.

Ora, o mundo Maçónico Português é essencialmente composto de incumbentes e cisões de incumbentes por motivos ligados ao hábito (em raros casos, à finalidade), os quais hábitos são transportados para as novas organizações (que rapidamente têm resultados idênticos às antigas).

Na nova edição que estou a prepara do meu livro “Quero Saber – Maçonaria” onde faço uma análise da Maçonaria Portuguesa actual na sua totalidade (fui o primeiro a listar os contactos e dados das 15 Obediências a trabalhar em Portugal à época da 1ª Edição [2013] – hoje devem ser mais de 20), falo das três principais novidades que emergiram nos últimos 7 anos:

  1. O surgimento do Rito Português e a sua história (não confundir com o Rito Eclético Lusitano do século XIX)
  2. A tendência de redução do tempo de mandato dos Grão Mestres
  3. A presença da Maçonaria no mundo Digital, incluindo Redes Sociais

Não vou de momento desenvolver os pontos 1. e 2., anotando apenas que até ao momento, desde o século XVIII, a Maçonaria Portuguesa alinhou-se sempre por dois eixos – divergentes desde o final do século XIX – o eixo Francês, especialmente através das relações fraternais com o Grand Orient de France, ainda hoje uma referência mundial na Maçonaria laica e adogmática, cujo principal exemplo é o Grande Oriente Lusitano; e o eixo Inglês, através das relações fraternais com a United Grand Lodge of England, representado na Grande Loja Legal de Portugal/GLRP. Ainda assim, mesmo movimentos mais recentes como as Obediências que praticam o Rito de Memphis-Mizraim, bem como a Grande Loja Feminina de Portugal, o Direito-Humano, entro outras, mantêm laços fortíssimos com as suas congéneres francesas. Ou seja, até à criação do Rito Português na Grande Loja Legal de Portugal/GLRP (que já não o pratica), toda a Maçonaria Portuguesa era… estrangeira…

No que toca ao ponto 3., a evolução deu-se em três períodos e vertentes. Desde logo houve uma desconfiança absoluta das Obediências face aos novos meios e, à parte os entediantes sites institucionais, houve sempre uma presença ausente ou monolítica. Com o surgimento do Facebook e a popularização do Youtube, foram os Maçons (e não as Obediências) que começaram a partilhar conteúdo, muitas vezes de forma indecorosa, mal informada, devassando o direito ao anonimato e à revelia de todos os juramentos ou da simples prudência, não obstante de forma entusiasta e frequente!

Irmãos das mais distintas Lojas e Obediências trocam hoje informação, fotografias, coscuvilhice interna no Whatsapp, Messenger e outros, sem respeito pelas egrégias determinações superiores de “estes são reconhecidos mas aqueles não”. Só mesmo a cegueira voluntária pode explicar que a “lepra maçónica” que está implícita em declarações do tipo “esses não são regulares” ou “esses estão proibidos de ter relações connosco” possa ter qualquer eficácia real no mundo digital de hoje…

Domage! Não há maçon ou Maçona que não tenha amigos e amigas, irmãos e irmãs, em múltiplas Obediências que se degladeiam entre si e fomentam zangas de anos, mas com os quais têm uma amizade sã, fraterna e profícua. Não é infrequente encontrarem-se “profanamente” e cultivarem a fraternidade maçónica fora do mundo institucional, não compreendendo (porque não é de fácil explicação!) porque motivo não podem encontrar-se lado a lado no Templo da Fraternidade Universal. É que hoje reconhecem-se online. Estão em contacto o tempo todo. Têm afinidades maiores do que as diferenças e entendimentos muito próximos sobres os assuntos que lhes interessam. Ou seja, em conclusão, há um mundo ilusório, de convenções e ufania, segregado, isolado, controlado pelas Obediências com os seus Decretos que nem os seus Grão Mestres, em muitos casos, seguem à risca; e depois há o mundo real (com base na comunicação virtual digital) em que a fraternidade global se corporiza, trabalha, age no mundo, se associa e vive, que escapa ao controlo das Lojas.

É este estado de coisas que leva a que, numa terceira fase, algumas Obediências começassem a pensar este assunto muito a sério. Recordo-me de trabalho muito avançado que conheci na Grande Loja de Filadélfia e na Grande Loja de Nova Iorque já em 2009, quando os templos começaram a esvaziar-se e o interesse na reunião cara a cara e depois mais um jantar dispendioso começou a diminuir. Na Europa foi a Grande Loja Unida de Inglaterra que liderou a mudança. Fez estudos profundos e abriu discussões aglutinadoras. Numa visita a uma Loja em Great Queen Street em 2010, habitualmente preocupada com a avançada idade da maioria dos membros, ouvi uma excelente comunicação acerca da renovação dos meios e métodos sem comprometer a integridade do Ritual e da Maçonaria, no sentido de apelar a membros mais novos da comunidade.

Todos este esforços deram resultados. Podem ser consultados nos websites das respectivas Grandes Lojas e uma pesquisa atenta mostrará múltiplas iniciativas de ligação ao mundo através das plataformas digitais, sempre sem comprometer o que é, sempre foi e será a Maçonaria. Do mesmo modo, podem encontrar-se diversos exemplo de referência no âmbito da multimedia, seja no Netflix ou em canais cabo (veja-se Lodge 49 na AMC americana). O Supremo Conselho Americano Jurisdição Sul em Washington deixou de ser monolítico e tem convidado canais de televisão de referência assim como produtoras de longas metragens, autores como Dan Brown e outros, a usarem os seus Templos, Museus, Bibliotecas e Auditórios para eventos. A Grande Loja Inglesa decidiu que a sua sede em Londres, no bairro contíguo ao dos teatros, deveria ser o maior e mais ilustrativo cartão de visita da Maçonaria. Vejam-se alguns exemplos em que o espaço foi cedido a título comercial, abrindo portas.

(Click to download: páginas 18 e seguintes)

Ou:

Mas mesmo os mais conservadores não poderão deixar de admirar a grandiosidade e a segurança nos seus valores – porque é preciso estar-se muito seguro do que se é – da Grande Loja Inglesa ao ceder os seus Templos à Maçonaria Feminina Inglesa – com a qual não tem relações litúrgicas!

Ai se fosse cá!

Notaram seguramente que é o Grande Templo em Londres e que há câmaras a filmar.

Em todas as críticas que ouvi, a vasta maioria vinda de meios Maçónicos que se sentem ultrapassados por uma Obediência que a reportagem caracteriza como “pequena”, “recente” e “não reconhecida”, ressalvam questões (questiúnculas) irrelevantes e já tratadas há muito, como fica demonstrado acima: imagens dos Templos, Maçons de avental, teatralização de passagens rituais (que até estão disponíveis na net), dar acesso aos meios de comunicação, eventos brancos, etc. Nada de novo e nada que Obediência nacional alguma possa objectar em face da prática que tem sido recorrente. Alguma coisa do que constitui o âmago da Ordem foi exposto ou profanado? Não creio.

O que está em causa é uma sensação de ultrapassagem por quem não é um incumbente. Tão só isso.

Não sou da Grande Loja Soberana. Estou com ela, como estou com todas. Convidem-me que eu apareço. Peçam-me que trabalhe para vós, e lá estarei. Sem favoritos.

Agora, meus caros, está na hora de ir trabalhar e mostrar que o Nova Maçonaria Portuguesa se estende por muitas Lojas e Obediências, tirando o simbólico chapéu à Reportagem da RTP. O que é, é.

Trabalhinho de casa bem feito e chega-se longe. Abrir as janelas, deixar sair o ar bolorento e começar um novo dia. Se os incumbentes olharem para a frente sem erguer tapumes e barreiras artificiais onde os seus membros só vêem campo aberto, num instante a Maçonaria Portuguesa recupera o lugar que é seu na sociedade.

Até lá, este é o novo standard.

Basta perguntar ao google.