Convento dos Capuchos 2023

O Convento dos Capuchos na Serra de Sintra é um dos locais mais surpreendentes e improváveis que conheço. Talvez por ser a expressão mais genuína da espiritualidade franciscana, longe da ostentação e do conforto de outros cenóbios mais “acomodados”, mostrando uma verdade espiritual difícil de explicar por palavras. É isso mesmo: ali vive-se a revolta de São Francisco. Intensamente. Ver hoje aquelas celas diminutas, o frio húmido da pedra, os corredores tortuosos, a simplicidade da natureza e o amor ao que é da terra pura, desafia o nosso entendimento. Ouço turistas dizer “que pobres eram, que falta de juízo viver assim!”, mas estão enganados.

O convite é esse: vir a apreender o Convento dos Capuchos de Sintra com TODOS OS SENTIDOS. Os 5 habituais, mas também aquele mais além, que nos poderá abrir o entendimento sobre a realidade espiritual dos seus senhores. Falaremos da história, de D. João de Castro, de lendas, demónios e tempestades, de iniciação e noviciado, do passado bem presente no espírito do lugar.

29 de Julho, 14h; Visita: 20€ + entrada nos Capuchos*

Inscrições: incursoeshermeticas@gmail.com

* Nota: Ver preçário em parquesdesintra.pt já que se aplicam reduções e excepções ao preço normal de 6,65€, dependendo do caso.

Visitas de Verão 2023

Com o início do Verão, tal como tenho feito em outros anos, vou organizar algumas visitas guiadas de teor histórico/filosófico com um forte pendor de Tradição Lusíada na senda de António Quadros, Lima de Freitas ou Agostinho da Silva. Trata-se de revisitar alguns dos lugares emblemáticos do nosso Património Luso como pretexto (sim, como texto prévio) para os experienciar com outros olhos, com a Alma “ligada”.

incursoeshermeticas@gmail.com

2 de Julho 2023; 15h – 18:30h
A Quinta da Regaleira é um dos espaços simbólicos mais concorridos e conhecidos de Sintra. Interpretações diversas acerca dos seus mistérios têm preenchido livros, jornais, revistas e programas de televisão. Fala-se de Maçonaria, de Templários, de Segredos Alquímicos. A verdade é que a intenção do autor (sim, autor, como se de uma obra de arte se tratasse), parece estar longe destes temas. Contudo o simbolismo está lá! Patente e visível!
Convido-vos a visitar a Quinta da Regaleira, porventura de novo, mas certamente com novos olhos. Sim, vamos alinhar todas as interpretações mais populares e discutir de que modo estão ou não presentes. Mas iremos mais além. Vamos tomar as principais referências de Carvalho Monteiro e Luigi Manini: A Divina Comédia de Dante; Os Lusíadas de Camões e os Jardins Iniciáticos como expressão cénica de um percurso interior. Com base neles vamos abrir novas vistas sobre a Regaleira. Vamos deixar-nos submergir pela natureza, guiar pelos sentidos e despertar do sono quotidiano para a luz do excepcional.

15 de Julho; 10:00 – 18:30
Alcobaça e Batalha, com almoço

Tragam os amigos e a família!

Vamos criar boas memórias e viver a alegria de ser Português. Que viva o Verão,

Luis de Matos

incursoeshermeticas@gmail.com

A Propósito da Morte da Vergonha (I)

Regresso às minhas reflexões “a propósito”, depois de dois anos de uma saudável preguiça sem muita actividade de nota. Destacam-se “A Propósito da Morte de Olga Prats” onde recordo um episódio da minha vida maçónica pretérita e “Também a Propósito da Reportagem «Segredos Maçónicos» da RTP1” de 2020 onde tenho uma fugaz aparição, o que motivou da parte dos meus amigos muitos comentários e perguntas a que procurei responder no post. Talvez este último comece a precisar de alguma revisão aqui e ali, mas lá chegaremos, se for o caso.

Hoje sento-me ao teclado para pensar a propósito de outro assunto. Há uma citação que é habitualmente atribuída a Martin Luther King Jr. mas que na realidade tem uma origem muito anterior, por vezes também atribuída ao Maçon setecentista Irlandês Edmund Burke (possivelmente de forma apócrifa), cujo conteúdo transcende as épocas e as geografias:

The only thing necessary for the persistence of evil is for enough good people to do nothing

Já tenho lido a versão Portuguesa ligeiramente editada como “Para que o mal triunfe basta que os justos mantenham o seu silêncio”.

A atribuição é dúbia, a citação original parece ter-se perdido, mas o facto de viajar no tempo e vir à superfície frequentemente mostra a relevância do seu conteúdo quando somos confrontados com a prepotência do mais forte sobre o mais fraco.

A citação foi recordada por John Stuart Mill em 1867, também foi usada por John F. Kennedy em 1961 para caracterizar a passividade de muitos Alemães durante a II Guerra face ao Holocausto, igualmente recuperada por Martin Luther King Jr ainda durante a mesma década para sublinhar o silêncio dos que viam a descriminação racial e a normalizavam pelo silêncio, foi campeã de impressões no Facebook sempre que mais um massacre acontecia numa escola Americana ou um negro era morto pela polícia em Minneapolis, só para recordar alguns.

O abuso de poder e de posição dominante é uma das caraterísticas de líderes débeis e incapazes, substituindo pela força e pelo flagrante incumprimento dos seus deveres ou das convenções a que livremente aderiram, pela lei ditada caso a caso e de modo arbitrário. Fazem-no porque contam com o medo e a conivência dos “justos que mantêm o seu silêncio”. É de tal modo vulgar e de tal modo frequente que afecta as organizações humanas regularmente quando a escolha dos líderes se faz entre os medíocres, por falta de alternativa.

Na Maçonaria Portuguesa o fenómeno é de tal modo regular e padronizado, porque as causas se mantêm sem mudança há anos, que eu mantenho desde pelo menos 2001 um registo dos “processos de intenções”, “perseguições internas”, “inquéritos disciplinares” e finalmente “expulsões” relativos à maioria das Obediências, já que ninguém escapa a ter, uma vez por outra, um esquizofrénico ao comando. Já este ano a Maçonaria foi notícia nos jornais regionais. Ameaças de expulsões, ataques à liberdade de associação, acusações “entre calúnias”, um fartote, contra os irmãos e irmãs de uma cidade da região centro tão bela e de tão boa gente, de que Lisboa se esquece tantas vezes… Felizmente houve quem tivesse bom senso. Mas os esquizofrénicos são os mais divertidos, porque se assustam até com a sua sombra e têm a mania que os outros não fazem mais nada na vida a não ser persegui-los! Lembro-me de um, que reunia ali para os lados de São Bento, cujos 1ºs Vigilantes eram sistematicamente expulsos quando estavam a meses de poder ser Veneráveis Mestres. Aliás, basta olhar os casos, a posição de 1º Vigilante é a que apresenta a maior “mortalidade maçónica” de todas. Precisamente por ser uma porta de acesso à Cadeira. Também aqui, em geral, a saída de um proscrito é obtida à custa do silêncio dos que, não concordando com as motivações arbitrárias emanadas das mais altas esferas, se escudam no receio de poder acontecer o mesmo com eles. E fatalmente, porque nada muda, acontece…

Em muitos casos as Regras, Estatutos e outros documentos internos não servem para nada. Divirto-me sempre que sou convidado a visitar uma Loja de uma qualquer Obediência e se discute o Regulamento Interno. A coisa mais inútil jamais inventada pela Maçonaria especulativa. Porquê? Ninguém se lembra que existe. São sessões e sessões a ler artigos e a consagrar intenções e comportamentos e depois, quando aparece a ocasião prática de os aplicar, há sempre um motivo, uma “autoridade superior”, um pretexto urgente para fazer outra coisa completamente diferente e a “talhe de foice”.

Note-se que não falo de casos concretos, para que não me venham acusar de interferência em assuntos internos de ninguém. A probabilidade de que alguma das mais de 20 Obediência Maçónicas em actividade em Portugal esteja a passar por apertos, precisamente neste momento, é muito grande. Por isso as minhas palavras fatalmente se aplicam a alguém, mesmo que eu não conheça o concreto das situações. Isso deve-se à ciclicidade do fenómeno em si e não a que eu o refira agora! Não estou a falar de ninguém em concreto. A sério. E posso comprová-lo! Fez este ano 10 anos que publiquei o meu livro “A Maçonaria Desvendada – Reconquistar a Tradição” (Editora Zéfiro; zefiro.pt), que diz às páginas tantas:

“A Maçonaria é erradamente usada como um universo de substituição, em que os que não têm poder no mundo profano se transformam em tiranozinhos insuportáveis e perigosos. (…) A ascensão de alguns líderes de estruturas maçónicas é inversamente proporcional ao êxito na sua vida privada pessoal e profissional. Longos conflitos laborais, ou com entidades reguladoras e fiscais (…) decorrem em tribunal causando grande impacto na auto-estima destes, precisamente ao longo do período em que lutam com mais afinco por ascender socialmente a escadaria de “poder” e “validação” da Maçonaria. Quando os tribunais [não lhes dão razão] (…) e pun[em] ou afasta[am] aqueles homens devido à sua comprovada incompetência ou desonestidade profissional, a terapia faz-se na Maçonaria e lá os vemos, de aventais, jóias e sautoirs – novos chefes – de feridas lambidas e anestesia geral (…) As estruturas a que presidem só avançam quando eles se forem. E isso pode demorar anos.

Aguçada a ambição, afagado o ego, redescoberta a dignidade que o mundo profano se recusa a dar – ganho o lugar de poder de malhete e espada na mão – o humilde torna-se arrogante.”

Luis de Matos (c) 2011/2021

Portanto, tendo escrito estas palavras em 2011, tendo já então conhecido alguns “tiranozinhos perigosos”, fica claro que o que me interessa é o fenómeno em si e não os intérpretes de ontem ou de hoje. Aliás, há muito fiz a minha paz com este assunto, porque sei como acabam estas crises para os tais “tiranozinhos”. Até ao momento o GADU não falhou em lhes dar uma valente lição sempre que quis (e que nem sempre lhes basta, diga-se), pelo que eu, quando sinto a mediocridade sem oposição a vir à superfície, ponho-me ao largo e espero.

Ora, “estar ao largo”, uma das muitas expressões idiomáticas que herdámos das Descobertas, não significa estar em silêncio. Não costumo contar-me entre os que se calam deixando o mal triunfar. Falo, mas falo de outra maneira e de outra posição. E isto hoje basta. Amanhã veremos.

Desde a publicação do meu livro há mais de uma década tenho tido o prazer de contribuir para o avançar do ideal maçónico em várias Lojas e Obediências, de forma quase sempre discreta mas decisiva. Lembro iniciativas relevantes em Nova Iorque (onde tive residência profissional) no contexto da Tradição Willermoziana, em Espanha em diversos contextos, incluindo a difícil situação da irregularização da GLNF entre 2008 e 2012 (por culpa de um “tiranozinho”!) a que pertencia em Madrid na época, bem como várias Obediências em Portugal com as quais sempre mantive – e mantenho – a maior cordialidade e as quais ajudei sempre que considerei poder estar ao serviço. Repito, desde 2011. Não é um posicionamento de modas que adoptei há um par de meses.

Assim, é com tristeza que vejo o valor sempre corrente da frase “Para que o mal triunfe basta que os justos mantenham o seu silêncio”. Seja ela da autoria de Edmund Burke ou de António Aleixo.

A resposta da mente reptiliana pelo “atacar ou morrer” quando o nosso ego está em causa é um dos vícios a que se cavam masmorras em Maçonaria. A atitude “ganhar ou morrer” já trouxe mais morte e retrocesso do que vitórias, sempre que aquilo pelo que se luta não tem nem mérito nem relevância para lá do nosso umbigo. Percebi isso cedo no meu percurso.

Deste modo compreendo perfeitamente aqueles que, apesar de não terem a razão suficientemente madura para travar a soberba do seu Cro-Magnon atávico, dão por si em posições de poder e o exercem sem maiores considerações pelos valores que defendem com o lado direito dos lábios, mas esmagam com o polegar da mão esquerda. Esses eu compreendo.

O que não compreendo é o silêncio dos bons.

PS: Vou falar com os amigos do “Assunto Sério” para fazermos um Podcast sobre isto!

A propósito da morte de Olga Prats

Morreu a pianista Olga Prats - SIC Notícias

Excerto de uma auto-biografia inédita sobre a minha ligação à Maçonaria, ainda e curso e sem data de publicação. Em 1992 Olga Prats deu um recital durante uma Sessão Magna da Grande Loja Regular de Portugal que me ficou na memória. Este excerto conta um pouco do sucedido, com uma pequena confusão feita com o nome do “Opus Ensemble”. Cá vai.


“A sessão de Magna de Equinócio de Outono de 1992 da Grande Loja foi uma ocasião festiva da maior importância. Lembro-me de que tinha sido nomeado Grade Experto no início de Setembro, a minha primeira posição como Grande Oficial, o que era um peso grande nos ombros (e um lindo avental azul-escuro debruado a ouro à citura). Depois de uma conversa no gabinete do Grão Mestre Fernando Teixeira fiquei com a incumbência de documentar as diferenças de reconhecimento entre os vários Ritos.

Vamos por partes.

Quando um Maçon se apresenta em visita a uma Loja de que não faz parte, é função do Irmão Experto (de “expert”, o “especialista” e não esperto, de “armado em…”), fazer o telhamento. As reuniões Maçónicas, por se realizarem em privado (“a coberto”), requerem que se verifique que aqueles que estão presentes têm as devidas qualidades e graus, pelo que aferir essa “cobertura”, como a palavra indica, é fazer o “telhamento”. Assegurar de que só esteja sob a telha ou o telhado quem, de facto, pertence à Ordem.

O telhamento é feito pelo recurso aos sinais, palavras e meios de reconhecimento dados aos Aprendizes no dia da sua iniciação. É algo que todos os Maçons têm obrigação de saber. São muito similares entre os vários Ritos, variando algumas das palavras de pormenor. A identificação destas variações não estava sistematizada, de modo que entendi que o Grão Mestre me nomeara Grande Oficial para fazer um trabalho de levantamento e, por ser Grande Experto, assegurar-me do telhamento dos visitantes estrangeiros que iriam estar na Sessão Magna, provenientes de vários países, continentes e Ritos. Tarefa pesada, a realizar e, poucas semanas.

Já não sei precisar, mas estiveram dezenas de Grão Mestres e suas comitivas, que iam confirmando a presença para a Grande Secretaria à medida que a data se aproximava. O Grande Secretário esforçava-se para me dar informações sobre o Rito de origem de todos os que vinham a Portugal. Muito rapidamente se foram acumulando confirmações do Rito Escocês Antigo e Aceite (da Europa) e do Rito Escocês Antigo e Aceito (diferença de pormenor, não obstante diferença a não ignorar!) de vários Estados do Brasil. Depois do Rito Escocês Rectificado (o meu, que conhecia bem), do Rito Francês, do Rito de Emulação, a que se juntou uma delegação do Rito de Schröeder e assim por diante. No espaço de dias preparei uma tabela de referências, questões e reconhecimento para poder questionar cada convidado e sobre a sua qualidade.

A festa seria em grande. Um andar completo do antigo Hotel Estoril Sol foi reservado e, nos dias anteriores à sessão, transformado num magnífico Templo Maçónico que iria acolher mais de 450 pessoas. A sumptuosidade da decoração sublinhava a solenidade. Algumas das Grandes Lojas presentes enviavam representantes pela primeira vez e a força da nascente Maçonaria Regular Portuguesa era notada internacionalmente. O Grão Prior Geral do Grão Priorado da Helvécia reunia em Mafra com um grupo inicial para preparar a criação de um Grão Priorado do Rito Escocês Rectificado em Portugal, falando-se ainda em outros círculos da possibilidade do apoio do Supremo Conselho do Grau 33º Jurisdição Sul dos Estados Unidos à criação de um futuro Supremo Conselho em Portugal.

Eram tempos de enorme entusiasmo no seio da Grande Loja, que crescia em número e qualidade.

Naquela ocasião fez-se a primeira Sessão Branca de Grande Loja, com a presença das Senhoras (bem como filhos e filhas de Maçons). Alguém se terá lembrado de falar com o Irmão Luis Prats da RL Mestre Affonso Domingues, renomado médico Psiquiatra, para sondar a possibilidade da participação da conhecida pianista Olga Prats, do Opus Ensemble, sua familiar, para fechar a Sessão Magna com um Recital que seria seguramente apreciado pelas delegações estrangeiras presentes, bem como por todos os Irmão Portugueses e suas famílias.

Duas notas antes de avançar. Uma sobre Luis Prats, que é descrito do seguinte modo no Blog “A Partir Pedra”, da sua Respeitável Loja;

“O Luís Prats foi o nono Venerável Mestre da Loja Mestre Affonso Domingues. No texto que dediquei ao seu veneralato, escrevi, a dado passo, que tinha uma conceção rigidamente esotérica, quase crística, senão mesmo crística da Maçonaria. Para ele, a Maçonaria é essencialmente um método de desencadeamento e evolução de um processo iniciático, tendente à aproximação do Homem ao Divino – um processo paralelo, por exemplo, ao misticismo monástico cristão. Isto é, e se bem interpreto o seu pensamento, o método iniciático maçónico é um dos métodos de aproximação do Homem ao Divino, como o são o dito misticismo monástico ou o budismo. Luís P. privilegiava, assim, o estudo, a teoria, a análise simbólica, tendo porém o cuidado de alertar para os perigos do que costuma designar de “devaneios esotérico-birutas” muito presentes em muita “literatura”, principalmente do século XIX.”[1]

Sobre Olga Prats, diz-nos a sua biografia que foi a primeira pianista a tocar e a gravar o argentino Astor Piazzola em Portugal e a divulgar o fado ao piano, nomeadamente as partituras de finais do século XIX e primeiras décadas do século XX de compositores como Alexandre Rey Colaço ou Eduardo Burnay. Ao longo dos quase 70 anos de carreira, a artista privilegiou a música de câmara, destacando a produção contemporânea. Começou a tocar piano aos 6 anos dando o seu primeiro recital em adolescente, aos 14 anos, no Teatro Municipal de S. Luiz, em Lisboa. Fez o Curso Superior de Piano no Conservatório Nacional onde tinham sido alunas a sua mãe e uma tia, e um bisavô professor. Ao terminar o curso em 1957, prosseguiu os estudos em Colónia, na Alemanha e em Friburgo, na Suíça. Olga Prats foi uma das fundadoras do Opus Ensemble, em 1980. Em 2008, o Estado português reconheceu a excepcionalidade da sua carreira e o seu contributo para a Cultura portuguesa, tendo-a feito Comendadora da Ordem Militar de Santiago da Espada.

Preparava-se assim um dia memorável.

Ao início da tarde as numerosas delegações estrangeiras foram-se reunindo numa sala com uma magnífica vista da baía de Cascais, preparada para que se pudessem paramentar condignamente. Ainda me lembro bem do Grão Mestre da Grande Loja de Espanha, Luis Salat Gusils quando o abordei no intuito de fazer o telhamento. Acabara de colocar o seu colar de Grão Mestre e olhou-me com ar divertido. Escolhi-o por falar um pouco melhor espanhol do que francês ou italiano. Sem delongas prestou-se ao exercício:

Eu: Hermano mío, de donde viens? (num portunhol característico, mas sem vergonhas)

Ele: **************

Eu: Dá-me a tua manu… Te voi a pedir o toke.

E assim por diante. Fiz um telhamento rigorosíssimo! E ele divertido, respondeu e agradeceu.

Seguiu-se um Grão Mestre de uma Grande Loja Americana, de que não me recordo. Foi um pouco mais difícil, porque eles se baseiam mais nos sinais e toques e menos nas perguntas e respostas. Mas adaptei-me bem e passei ao seguinte, um Grande Inspector do Grande Oriente do Brasil. Sempre de cara cerrada, fiz o meu papel com todo o rigor. Com ele a coisa não correu tão bem, porque se atrapalhou e nem sinais, nem toques nem palavras. Perguntei-lhe qual era o Rito dele, para ver se facilitava, mas respondeu “Rito Maçônico, né?”, o que só contribuiu para a confusão. Todos os Ritos são maçónicos… Fiz-lhe então algumas perguntas mais básicas (“a que horas começam a trabalhar os Maçons”, “a que horas terminam”, “onde se senta o venerável Mestre”, etc.). Lá consegui fazer um reconhecimento básico.

Passei ao Grão Mestre Interino da Grande Loja Nacional Francesa, Claude Charbonniaud, que eu já conhecia. Fazer um telhamento em Francês não é fácil, especialmente quando se trata do Grão Mestre de uma das Grandes Lojas com mais Ritos e alguém muito conhecedor da Ordem em todas as suas vertentes. Num dado momento, quando lhe disse que era do Escocês Rectificado e que tinha sido iniciado na sua GLNF, vi-me na desconfortável posição de ser Frére Charbonniaud a telhar-me a mim! Ele virou o bico ao prego e fez-me recitar quase toda a primeira secção do Catecismo do RER que conhecia de cor, melhor do que eu! Logo que pude, aliviado, passei a outro convidado.

Estava eu nisto quando veio falar comigo a correr o nosso Assistente do Grão Mestre Mestre, Irmão JCN, mandado pelo Grão Mestre Fernando Teixeira:

AGM: Luis, o que é que estás a fazer?

Eu: Estou a telhar os convidados.

Chamou-me à parte:

AGM: Estás doido? São Grão Mestres, pá! Não se vai fazer um telhamento a Grão Mestres! São nossos convidados! Se eles não forem reconhecidos, quem é que é?

Eu: Desculpa, essa é a minha função como Grande Experto. Ordens do MRGM.

AGM: Deves ter ouvido mal! Foi ele que me mandou vir aqui para que estejas quieto! Ordens do Grão Mestre. Pára já com isso. Não podes telhar Grão Mestres nem Grandes Oficiais porque podem não saber responder! São nossos convidados e ponto final. A gente já lhes reconhece a qualidade. Não achas?

Eu: Er… Então para que é que temos um Grande Experto?

AGM: Para ver se a Grande Loja está coberta. Mas houve alguém que se queixou.

Eu: A sério?! Até agora não tive problemas. Só o…

AGM: Não interessa. É para parares com o telhamento! Não se faz telhamento a Grão Mestres! É uma ordem. Vai ajudar o Grande Secretário com as inscrições para o jantar. Deixa os Grão Mestres em paz.

Eu: Peço desculpa. Talvez tenha sido zelo a mais.

E foi, claro. Ainda novinho nestas coisas, levei a função muito a sério. Ainda não sabia que não era suposto. Pensando que não eram títulos para pendurar ao peito, mas funções a desempenhar, acabei por dar de caras com quem sabia ainda menos do que eu e que representava ali milhares de Maçons do seu país. O erro foi – é claro – meu.

O que é curioso – e ainda hoje me lembro – é que os Grão Mestres que conheciam bem a lição entraram no jogo, uns mais divertidos, outros levando a coisa a sério e esforçando-se por responder e outros, como Claude Charbonniaud, mostrando-me que, naquele nível, eu não podia esperar telhar sem ser telhado. Não podia exigir rigor sem me submeter eu mesmo ao rigor. O que fiz. Naquele dia aprendi imenso. Quem se exalta, será humilhado.

Nunca mais estive numa Sessão de Grande Loja onde se fizesse um telhamento. Talvez isso explique o modo como muitas vieram a correr. No final do mandato do Grão Mestre Fernando Teixeira passei a Grande Oficial Ad-Vitam e não se falou mais no caso. Também não aceitei mais convites para Grande Oficial em nenhuma Obediência, não vá eu enganar-me e pensar outra vez que é para ser a sério.

A Sessão Magna foi memorável e irrepreensível a todos os níveis. Foi uma festa de fraternidade e uma demonstração da força que a Maçonaria Regular convocava consigo em 1992 e continuariam em crescendo por mais alguns anos. O Recital de Olga Prats ao piano, instalado junto ao Oriente, foi dos momentos mais belos de que me recordo nesses anos iniciais da Grande Loja. A música tem o dom de nos elevar de uma forma excepcional, tal como todas as artes. Mas no caso do piano, há algo de imanifestado e impalpável que só o tímpano e o coração descodificam. Quando essa ligação metafísica se dá por intermédio da expressão de um talento como o de Olga Prats, passamos a estar num patamar ainda mais elevado. A recordação ficou, indelével.

Mas a noite não acabaria sem mais uma peripécia. Ao preparar o pagamento dos artistas e rider técnico, o Grande Secretário, já seguramente cansado, em vez de passar o cheque da Grande Loja à ordem do “Opus Ensemble”, passou-o ao “OPOS DEI”. Foi,  com toda a certeza, o único cheque da Maçonaria Portuguesa àquela Prelatura da Igreja Católica.

É claro que o cheque teve de voltar para trás e ser passado de novo, agora sim ao destinatário certo. Mas o original, em erro, ainda andou lá uns meses, emoldurado, na Grande Secretaria para quem o quisesse ver. “Page-se ao Opus Dei.”

(c) Luis de Matos 2009-2021


[1] a-partir-pedra.blogspot.com, por Rui Bandeira”

Quando os vigilantes não vigiam

Vejam só o que encontrei numa sala de arrumos na igreja de São João Baptista em Tomar. Mandaram-nos lá arrumar uns aquecedores e uma botijas de gás e lá estava, a atrapalhar, um triptico renascentista! Ali, na sala de arrumos. E depois dizem que as coberturas ardem e é estranho… Não vejo nada de estranho se aquilo arder.

Pérolas aos Poucos III – A Máscara

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Episódio III – A Máscara

(excerto)

Luis de Matos: (LM): A noção do anónimo é interessante porque leva-nos a pensar na forma como, na Tradição, Saint-Martin (que era um filósofo francês), tentou viver a Caridade. E a caridade deve ser anónima. A caridade deve ser feita, de facto, sem rosto. Devemos fazer a caridade sem que se saiba de onde ela vem. Era essa a sua forma de pensar.

Alexandre Honrado (AH): Há um movimento actualíssimo que diz que nós estamos a dirigir-nos todos para um momento de exigência da “caritas”, não da caridade de mão estendida, mas outro tipo de caridade. Uma caridade mais profunda em que dás de ti, o melhor de ti, para salvares os melhores que estão à tua volta e depois os que são piores então percebem que podem ser melhores.

LM: Sim. Ele chamava-lhe uma Caridade reparadora. Porque a ideia é reparar.

AH: Regeneradora ou reparadora.

LM: Exactamente. Porque há a caridade que mantém aquele que necessita da caridade, necessitando dela. Uma côdea de pão hoje, outra côdea de pão amanhã. E depois de amanhã a que horas é que vens cá buscar a tua côdea de pão? É que com uma côdea de pão nunca vais a lado nenhum. A Caridade de que ele fala não é essa. É a Caridade reparadora, de facto.

AH: Exactamente.

LM: E há uma Ordem que foi estabelecida à volta das suas ideias, que é a Ordem Martinista, que tem uma influência muito importante na cultura popular. E porquê? Porque aqueles que são iniciados nesta Ordem passam por um ritual onde a máscara é um ponto essencial. A máscara faz parte da sua vestimenta ritual.

AH: Mas com que essência?

LM: Colocam a máscara para poderem ser “invisíveis” no mundo.

AH: Nesse sentido…

LM: Nesse sentido.

AH: E a máscara introduz alguma expressão?

LM: Não. É aquela máscara…

AH: Anónima?

LM: Anónima. Completamente anónima. É aquela sem qualquer tipo de decoração. É completamente negra. Faz lembrar precisamente os heróis anónimos que vão aparecer depois na cultura popular.

AH: Mais uma vez os americanos, importando da Europa uma série de símbolos…

LM: Importando, fazem esta síntese. É o caso do Zorro. É um herói claramente ligado a esta tradição Martinista.

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LM: Estamos a ver uma imagem. A máscara é esta, negra. Ele tem a espada do herói, a espada da justiça e tem uma capa negra. Os Martinistas é assim que se vestem [com esses elementos: capa negra e máscara negra, com a espada com recordação da justiça.]  E depois do Zorro temos uma série de outros personagens. por exemplo, o Lone Ranger com o seu cavalo , que são sempre personificações de “cavaleiros” anónimos que ninguém sabe quem são na vida real.

AH: (…) Esta capa está presente nos heróis todos.

LM: Está cá porque [é uma referência] à lenda de São Martinho, que rasgou a sua capa para dar a um pedinte. A sua própria capa rasgou-a em duas e fez duas capas. Depois aparece-nos [mais tarde] o Super-Homem, que também tem a sua capa.

AH: Exactamente.

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LM: A máscara do Super-Homem é diferente.

AH: Tem duas máscaras…

LM: Tem duas máscaras. (ri-se)

AH: Tem a da vida real, porque ele é jornalista e mascara-se de pessoa comum e depois tem esta máscara do super-herói.

LM: É isso. Ele usa a máscara da vida real. Mas a noção [subjacente] continua a ser esta do anónimo. Aquele que vive entre os comuns, mas que tem poderes extraordinários. O Batman é outro caso, mais um herói que tem a sua capa e a sua máscara. O que é interessante entender é que estes super heróis que vão aparecendo vêm do passado, vêm [na linha] da tradição Martinista e de Saint-Martin. No caso do Batman já estamos a falar de um herói com conotações mais negras. A máscara é-nos apresentada na cultura popular anglo-americana numa última figuração muito interessante, que é a do Dath Vader.

(continua…)

Jornadas de Estudo – Maçonaria e Cristianismo

O IHS em cooperação com a Justa e Perfeita Loja “Adhuc Stat!”, nº 5 do GPRDH, com a Akademia Maçónica de Sintra, com a Editora Zéfiro e com o Grupo de Estudos e Investigações Martinistas e Martinezistas de España (GEIMME) vai promover no dia 29 de Setembro uma Conferência pelo Presidente do GEIMME relativa ao Rito Escocês Retificado, um dos mais importantes e mais bem documentado Rito Maçónico surgido há mais de 200 anos na França pré-revolucionária. O Rito Rectificado é cristão e está organizado de modo muito particular, já que não tem Altos Graus, mas sim uma Ordem Interior que supervisiona todo o conjunto maçónico.

A Conferência é muito aguardada e tem por título “Las Claves Espirituales de la Masonería Cristiana”, sendo uma oportunidade para Diego Cerrado discorrer acerca das origens cristãs da Maçoniaria, de que modo essas origens estão ainda presentes na Maçonaria nos seus múltiplos Ritos e de qual é a proposta iniciática da Maçonaria Rectificada, fundamentada essencialmente na doutrina de Martinez de Pasqually e na Escola de Alexandria original, de Orígenes e Clemente, fontes do Cristianismo Primitivo.

A Conferência insere-se nas comemorações do 1º Aniversário da Loja “Adhuc Stat!”, nº5, Loja Maçónica Rectificada a trabalhar em Portugal sob os auspícios do Grão Priorado Rectificado de Hispânia.

Os números de 2010

Os duendes das estatísticas do WordPress.com analisaram o desempenho deste blog em 2010 e apresentam-lhe aqui um resumo de alto nível da saúde do seu blog:

Healthy blog!

O Blog-Health-o-Meter™ indica: Uau.

Números apetitosos

Imagem de destaque

Um Boeing 747-400 transporta 416 passageiros. Este blog foi visitado cerca de 8,000 vezes em 2010. Ou seja, cerca de 19 747s cheios.

 

Em 2010, escreveu 36 novos artigos, nada mau para o primeiro ano! Fez upload de 102 imagens, ocupando um total de 8mb. Isso equivale a cerca de 2 imagens por semana.

The busiest day of the year was 14 de Junho with 145 views. The most popular post that day was “A Maçonaria Desvendada” – Entrevista parte 1 de 9.

De onde vieram?

Os sites que mais tráfego lhe enviaram em 2010 foram ihshi.com, cpeubiose.org, facebook.com, maconaria.net e forum.thomar.org

Alguns visitantes vieram dos motores de busca, sobretudo por um blog universátil, museu da república e maçonaria, maçonaria, universatil e maçons famosos

Atracções em 2010

Estes são os artigos e páginas mais visitados em 2010.

1

“A Maçonaria Desvendada” – Entrevista parte 1 de 9 Junho, 2010
6 comentários

2

A propósito de um museu da “República e da Maçonaria” Fevereiro, 2010
8 comentários

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Coleccionador constrói Museu da República e Maçonaria em Pedrógão Grande Fevereiro, 2010
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